Essa semana revi “On the Road”, do Walter Salles. Que bosta! Impressionante como o filme é ruim. Não que hoje em dia ainda ache o livro grandes coisas. Cada dia que você fica mais velho e mais sábio, Kerouac se torna mais picareta. Em mesa de boteco, quando esse assunto surge, tipo uma vez por ano, sempre dou a mesma opinião: “comé que o cara era um beatnik de verdade, o mais famoso deles, se sempre voltava pra casa pra pegar mais dinheiro da tia?”.
O ato de viajar não mudou tanto de 1950 pra cá, o sentimento é o mesmo. Quando me perguntam porque gosto tanto de viajar, de cair na estrada, cada hora tenho uma resposta diferente. O sentimento de liberdade é o mesmo, mas viajo por viajar, não pra chegar em algum lugar. A melhor coisa sobre viajar não é chegar em algum lugar, e sim ir.
Alguém deveria fazer um estudo sobre os males de não viajar. Pegar essas pessoas que – veja bem, por opção -, passam a vida entre casa, emprego, emprego, casa. Até quem não viaja por falta de opção, não viaja porque não quer: estabilidade, rotina e cotidiano são escolhas. Qualquer pessoa, de qualquer classe social, pode viajar quando quiser – só muda as possibilidades sobre destino. O que impede alguém de viajar é a falta de vontade a capacidade de abrir mão de coisas que não importam.
Em 1950 muitas pessoas tinham vontade de viajar, pegar carona, e simplesmente iam. Outras pessoas, mais atrasadas, ficavam presas com a mesma vida e rotina, sem sair do lugar. Em 2015, é exatamente a mesma coisa: existem as pessoas que acreditam em trabalho, criam seu próprio emprego, e se permitem viver a vida à máxima potência, fazem contatos no mundo inteiro, enviam idéias de projetos para escritórios de vários países, e existem as pessoas que acreditam que o certo é acordar as 8h, ir trabalhar, tirar uma hora de almoço, sair às 18h, ir pra casa e assistir novela, ver Fantástico, Faustão, trabalhar 335 dias por ano e tirar 30 de férias.
Não digo que todos deveriam tentar viver um pouco mais à deriva da sociedade. Isso seria impossível. Mas talvez ser menos dependente dela. A sociedade faz uma pressão absurda e diária para que você não faça o que gosta, não viaje sempre pra onde quer, não se demita do emprego, não mude de profissão aos 40. Some isso ao fato de viver em um país em crise, e você tem uma geração de jovens de 20 e poucos e 30 e poucos anos se mandando do país para tentar a vida em outro lugar, ou só mesmo viajar. Não caia na mentira de que o mais certo é trabalhar muito quando jovem e viajar mais velho. É o contrário: qual é o problema de juntar 1000 reais ou 100 mil reais e viajar? Quando o dinheiro acabar você volta e começa tudo de novo.
Tome cuidado. Eles vão falar que você é imaturo, irresponsável, que essa coluna/pensata é ridícula, que é fácil falar pra quem tem condições financeiras, que não é o momento, quem sabe ano que vem, que você vai jogar tudo que construiu fora. Tudo mentira e desculpas de covardes. Quando você pratica esportes tem sempre que jogar com quem é melhor que você. Só assim você se torna melhor. Na vida é igual. Só escute quem você admira, e só ande com quem te acrescenta. A opinião não desejada não serve de nada, apenas para enaltecer a amarguras da vida dos outros.
A grande merda de “On the road” do Walter Salles é que ele retrata Dean, que no livro sempre foi um espírito livre que incentivava Sal a viajar, como quase um vagabundo, irresponsável, como alguém que não amadurece e não sabe criar raízes. Não caia nessa. Em 2015, com o mundo em crise e um apartamento de 40 metros quadrados valendo 1 milhão de reais, mais vale ser um Dean Moriarty deprimido, que viveu em abundância, do que um Sal Paradise de black tie saindo da ópera para jantar no restaurante badalado do momento. 2050 tá logo ali pra você.
Tudo que importa de verdade cabe no seu bolso e no seu coração. O que não couber, tem que caber em uma mala de mão. Deixe ela sempre pronta. Mais vale se arrepender de coisas que você fez, do que se arrepender de não ter feito coisa alguma. A nossa vida termina logo alí. Crie uma meta, escolha uma data, e vá fazer o que você ama e quer da vida.
PS: Leiam “O Primeiro Terço”, de Neal Cassady, e “Zen e a arte de manutenção de motocicletas”, de Robert M. Pirsig.